É de conhecimento de todos nós brasileiros que o Brasil é um país democrático e que as Leis possuem diferentes pesos e medidas a depender de cada indivíduo. Os que têm muito dinheiro conseguem com maior facilidade se livrar das possíveis penalidades, já um ladrão de galinha que furta por sentir o estômago roncar lhe falta recursos para se livrar das pesadas grades. A justiça que se diz justa é tão injusta que chega a ser justo chamá-la de injusta. São tantas as Leis, as Normas, as Resoluções que ficamos a pensar: “Para que tudo isso mesmo?”. Quanto maior o número de regras, mais fácil fica encontrar uma saída, as ditas “brechas da lei”.
Um pobre homem da zona rural, trabalhador, levanta com os galos e trabalha o dia todo sob o calor do sol do Sertão, certo dia ao adentrar em sua residência sentiu a falta de seu aparelho de DVD. A janela se encontrava aberta, alguém havia entrado no recinto. Pensou em levar o caso à Polícia, porém recuou, muito trabalho e no final daria em nada. Um aparelho de DVD, pouca coisa para roubar o sono de um homem trabalhador.
No outro dia cedo, ele se perdeu nos afazeres das obrigações, sequer se lembrava mais do que lhe fora furtado no dia anterior. Ao chegar a casa, já era final de tarde, um singelo sinal lhe trouxe a mente o ocorrido, a janela estava novamente escancarada. Olhou para a estante e lá não se encontrava o aparelho de som. “Tenho que levar o caso ao conhecimento das autoridades. Mas se eu levar, o danado certamente fugirá. Se ele apareceu em duas oportunidades, aparecerá em uma terceira. Deixe-o comigo” – pensou o homem.
Durante a noite, o homem espalhou entre os amigos que na manhã seguinte antes que o sol ousasse pôr o rosto para fora sairia em viagem para a sede do município. O lugar pequeno, logo todos já estavam sabendo, inclusive o bandido.
As oito em ponto, passos do lado de fora, pouco tempo depois a janela foi aberta, os raios solares clareou o recinto. O silêncio predominava, campo limpo para os malandros agirem. Entrou como se fosse o dono da residência, desconectou os cabos e apanhou com as duas mãos o televisor; em seguida virou em direção a janela e se colocou a andar. Um barulho, uma corda, um aperto, o peixe faminto mordeu a isca.
- Como sou bom no laço. Boi nenhum nunca me venceu, não seria um verme a ser o primeiro. Nem pense em deixar a televisão cair.
Aproximou-se e ao olhar para o rosto reconheceu de imediato o rapaz. Tomou a televisão e a pôs sobre a mesa. O rapaz tremia, pedia perdão, clemência…
- Você irá responder à Polícia.
- Se meu pai souber que eu fiz isso, ele me mata.
Amarrou o danado e o deixou dentro de um quarto, não podia gritar porque estava amordaçado.
- Vou, mas não demoro.
O homem saiu a cavalo feliz pelo feito. Chegou a delegacia e comunicou ao delegado.
- Delegado, capturei um bandido.
- Como?
- Peguei um bandido furtando minha residência. Como sou bom no laço, foi fácil pegá-lo.
- Você sabia que o que você fez é crime?
- Crime? Por quê? Pegar bandido é crime?
- Vamos lá.
Chegando ao local o delegado pediu para que o dono abrisse a porta.
- Onde está o elemento?
- Dentro do quarto, trancado.
- Deixar uma pessoa em cárcere privado é crime.
Abriu a porta e o rapaz se encontrava no chão a remexer.
- Solte o rapaz.
- Soltar? Mas ele é um bandido.
- O senhor, por ventura, tem provas?
- Provas?
- Solte-o agora!
O homem a contragosto fez o que a autoridade lhe obrigou.
- Agora, você, pode ir – falou o delegado.
- Posso? – perguntou o rapaz.
- Quanto ao senhor, levá-lo-ei a delegacia. Responderá pelo crime cometido.
- Que crime, delegado?
- Cárcere privado.
Ele olhou para o rosto do rapaz, esse sorria de contente.
- Antes tivesse o matado, pelo menos não veria a risada deste infeliz.
O delegado conduziu o homem a delegacia. Ele deu o depoimento, pagou uma fiança e voltou triste para casa. Mas não pense que acabou o pesadelo, o pobre ainda passou por mais uma de doer na alma. Ao entrar em sua casa, a janela estava aberta, sequer fora fechada, sobre a mesa faltava-lhe a televisão. Aí alguém irá indagar: “Quem a levou”. Melhor nem falar, vá que sobra para nós também.