
- Compadre, há quanto tempo.
- Já faz um mês que não venho em sua residência, compadre.
- E aí, como andam as coisas?
- Compadre, para ser bem sincero, mais ou menos.
- O que foi que aconteceu, compadre?
- Foi por isso que estou aqui. Preciso de quinhentos reais emprestados, tenho uma divida a vencer hoje, se eu não pagar, pagarei um juro alto. O compadre tem para me emprestar?
- Tenho oitocentos reais guardados para quitar uma prestação no próximo dia vinte.
- No dia dez eu garanto que você estará com o seu dinheiro em mãos.
- Se for assim.
- Se não for pedir muito, passe-me os oitocentos.
- Mas o compadre não só carece de quinhentos?
- Tenho outros negócios pendentes na praça. Dia dez eu irei receber mil e duzentos reais.
- Amigo é para essas horas…
O dinheiro foi passado de uma mão a outra. O homem se despediu sorrindo, o outro ficou em casa meu ressabiado.
Os dias transcorreram, passou o dia dez, no décimo nono dia, o compadre que havia emprestado o dinheiro lembrou que o outro compadre ainda não tinha lhe devolvido os oitocentos reais. Ele então se dirigiu a residência do amigo.
Ao chegar defronte a casa, bateu palmas, chamou pelo compadre, após dez minutos de insistência, a esposa do camarada saiu à porta.
- Você está louco, compadre? Para que tanto barulho?
- Há dez minutos estou a chamar, pensei que não havia ninguém em casa.
- E mesmo assim continuou a gritar. Eu estava tomando banho.
- O compadre se encontra?
- Não. Ele saiu. Não, viajou. Só retorna amanhã à tarde.
- Precisava falar com ele ainda hoje.
- Só amanhã. Se for urgente terá que esperar. Um dia a menos, um dia a mais, tanto faz.
- Diga a ele que amanhã eu retornarei.
- Certo. Até mais, compadre.
- Até mais, comadre.
O compadre deixou o local de orelhas em pé. Já havia passado nove dias do combinado, a mulher tinha dito que estava no banho, porém estava suja feito uma porca. Nesse angu certamente tem caroço.
No outro dia, no final da tarde, o compadre voltou à residência do amigo. A comadre saiu e disse que o esposo não se encontrava. No outro dia cedo retornou, a comadre repetiu as mesmas desculpas. O compadre fez que foi embora, mas ficou a espreita. Não demorou em o devedor pôr a cara para fora, o danado estava lá dentro. Rapidamente retornou ao interior, pois escutara algum ruído.
- Compadre, compadre! – batia palmas. – Compadre!
A esposa do homem saiu igual uma fera a defender suas crias.
- Mas ainda há pouco eu não lhe disse que o meu esposo não se encontrava? Agora vem o senhor de novo azucrinar a vida dessa mulher trabalhadora.
- É que eu preciso falar muito com ele.
- Ele saiu e não tem hora para voltar.
- Vagabundo eu sabia que seu esposo gostava de ser, mas mentirosa eu ainda não sabia que a comadre era.
- O compadre está me chamando de mentirosa?
- Com todas as letras: mentirosa, mentirosa e mentirosa! O compadre está aí dentro, pois eu o vi sair agora mesmo.
- Esposo, você viu o que o desgraçado do seu amigo me disse: chamou-me de mentirosa.
O homem apareceu cuspindo fogo pelas ventas.
- Ficou doido, compadre? O que é mesmo que você quer defronte a minha residência? Quer perturbar a vida alheira?
- O compadre ficou de me pagar dia dez os oitocentos reais.
- Fiquei, mas agora é desaforo, não vou pagar mais. Como pode um amigo desconfiar do outro assim. Só porque veio me cobrar, agora é honra, não pagarei sequer um centavo.
- Mas você me tomou emprestado.
- O compadre prova? Assinei algum papel? Se não, não lhe devo nada.
- Se meus amigos são dessa forma, não quero nem saber como são meus inimigos.
- Depois dessa desfeita, não me considere mais seu amigo.
- Os oitocentos reais para mim, são oitocentos reais; minha amizade, amizade de longas datas, custa bem mais. Fique com os oitocentos reias. Tomara que não venha a precisar de mais dinheiro no futuro.
O compadre se foi, o compadre e a comadre ficaram, amizades despedaçadas, a vida segue entre tombos e glórias, o dinheiro sempre a dominar as relações.